segunda-feira, 2 de julho de 2007

Mesa do Café do Teatro, 16.08.2005

Desoprimida
a última lágrima
criativa
que me escorre
em poema
Ativada
a vontade de perpetuar
o choro/banho
de poesia
Aqui está o
momento gravado
ao findar
do dia


Teu seio
flor doce
perfume macio
a provocar
o latejo
do meu tesão
Teu beijo
sabor perpétuo
a abrir
meus canais
de emoção


mar de
felicidade
respirar teu ar
por toda a
eternidade


rasguei a
garganta
com um grito de
paixão
meu peito se
agiganta
com seu toque de
tesão
minha vida se
encanta
com seu
beijo/imensidão


escutei tua voz
perdida
gemida
oprimida
quero te curar
qualquer ferida
quero te ter
quero te ser
quero tua
Vida
me dá uma
chance
que te envolvo
num delírio
de romance


anexei
um arquivo
no teu recinto
acessei
um site
com meu pinto
te devassei
com um vírus
de amor
bem limpo


te apedrejei
com meu pecado
quente visão
pintei um quadro
tintas fortes
sem recato
delírio fescenino
de menino
perdido em telas
e palavras
um pobre bardo
a escrever um poema
saído do seu
retardo


Cala o bico,
poeta!!
Tira esse teu
brinco e
te remete à realidade
aqui da vida!!
Teu verso é
nada,
teu eu é nada,
tua luta
é nada!!
Para de verter
versos inúteis
porque a palavra
aqui no real
é puramente
produto comercial!!
Deixa de te achar
invento
porque tua existência
é fora do tempo!!
Deixa de inventar
brincadeiras porque
a realidade aqui
não é lúdica!!
Lúnático inútil,
carta fora do
baralho, ficas aí
pensando que és
artista ducaralho...
Pobre ser,
nada és,
daqui a pouco
nem tostão terás
para vestir
teus pés!!

BUSCA

Meu amigo ator, dramaturgo e acadêmico de letras Gabriel Dória Rachwal deu seu parecer sobre meu livro de poemas"Busca".



Sentimentos transbordam dos poemas. O aclamado poeta-engenheiro João Cabral de Melo Neto sofreria revoluções intestinais caso pudesse entrar em contato com os poemas de Cláudio Bettega. O eu aparece, sem rodeios, em algo em torno de 99% dos poemas. Sem medo de ser tachado de sentimentalóide o poeta coloca seu coração pra pulsar a menos de um palmo da fuça do leitor. O poeta não faz isso sem se defender, afinal é exposição demais em tempos ferozes como o nosso. Pra chorar e falar despreocupadamente hoje em dia, só mesmo marcando consultas psicoterapêuticas. A defesa que o poeta encontra é a auto-crítica. O livro está recheado de poemas que questionam o seu próprio fazer poético. É possível encontrar, até mesmo, um poema inteiro denegrindo a poesia:
"poesia vadia
pedaço de carne destroçada
detrito-excremento do intestino mental
pilha de palavras bagacentas (...)"
Outra característica dos poemas é trazer o leitor para perto do ato da criação poética. As rimas, muito presentes, vão embalando e fazendo a leitura ser fluida. No meio dessa fluidez o poeta fala sobre como faz, o que faz e para quê faz. Aqui vale a pena citar o poema inteiro, ele ilustra bem essa tensão entre expor-se e, ao mesmo tempo, defender-se:
"não estava muito a fim
de escrever um poema agora
mas a pena me chama
sentimentos me chamam
a vida me chama
para desovar verdades
sensações
vontades
expressar o que está escondido
feito pão amanhecido
transformar tudo em arte
poesia que faz parte
do movimento do mundo
do tempo
de cada segundo
abraçar a palavra
compor frases, versos,
desarmar a trava
de conceitos dispersos
plantar beleza
colher maravilhas
pra que enfim eu deixe
de me sentir uma ilha"
Os dois últimos versos explicitam/expõem o por quê escrever: o poeta quer se integrar, ainda que a sua maneira, ele busca uma integração. Não quer o estado de ilha e a escritura-catártica do poema parece aliviar o peso incômodo de se sentir uma ilha. Os demais versos falam do como escrever, é o poeta em sua oficina, expondo "o que está escondido". Somos levados a conhecer a intimidade do processo criativo. O poeta se faz acompanhar por seu leitor no ato de escrita. Ato este que sempre privilegia a livre intuição, o sentimento, o sentir, deixando de lado a razão. Um emblema dessa preferência é a negação de formas rígidas e dos metros, preferindo irmanar-se da tradição de poesia marginal. O que não nos impede de encontrar um soneto na página 68 e ver que o verso livre não é um dogma e que se o poeta achar que deve usar uma forma clássica, não verá problemas. As contradições que a razão pode detectar não são levadas em conta. "sentimentos me chamam" é o verso que lemos. Na página 34 temos um poema que começa de supetão: "vou derramar / a substância / da inconstância". Como vários outros, este poema começa rápido, tem rimas e fluidez, ninguém conseguiria dizer que é um poema racional. No entanto, lá pro fim do poema, parece que um lampejo de racionalidade afeta o eu-lírico que, por um instante, fica reflexivo e duas vírgulas quebram o ritmo embriagado do poema. Por três versos temos um questionamento racional: "e, enfim, nem sei porquê disse tudo isso aí" Voltando ao ritmo mais fluido o poema já dá uma possível resposta: "talvez para fazer poesia/ agora /aqui" Dada a resposta o livro segue em frente. Os obstáculos não têm força para cessar o surgimento de mais versos e poemas. Bettega é pura intuição. Seu senhor são as vontades e as pulsões. Por mais que haja rastro de imperfeição e a razão possa questionar, Bettega faz prevalecer a vontade. Os poemas eróticos mostram bem isso. Não há meias palavras, o desejo aparece com a força do presente do indicativo: "te penetro". É o desejo realizado em tempo real: no tempo da escrita, no tempo da leitura. Enfiar a cara no livro, seja pra ler, no caso dos leitores, ou para escrever, no caso de Bettega, é a chance de não ver a realidade a que um desses "anjos frustrados" (vide terceiro poema) nos destinou, e ter alguns bons momentos em meio às realizações que o papel permite.

domingo, 1 de julho de 2007

Do Baú

Resisti o quanto pude. Mas a dor da criação me impunha impulsionar a mera caneta barata no papel sem luz nem um teclado a comandá-lo. Qualquer erro, minha função "delete" será um risco por sobre a palavra errada. Fico aqui pensando no quão chato será depois digitar este texto. E torço para que ele muito não se estenda. Mas seria isso possível? É possível controlar o desejo de se perder em qualquer noite já perdida dentro de qualquer bar, qualquer antro, qualquer canto cheio de (des)encanto? Os olhos que perscrutam outros olhos embaçados, outros olhos perdidos, outros olhos sem função... O pulsar, o emitir, transgredir a fo(ô)rma de qualquer respiro sincopado... Sinopses de absurdos que brotam de argumentos tolos, arremedos de frases que se querem criativas mas não abandonam a origem obsoleta. Vai, caneta, vai. Tece a teia do enredo tosco, do regurgitar de vacuidades vocabulares. O mundo aí, em guerra e fome, e eu aqui, querendo que um poema um dia semeie a tempestade do amor à arte. A política em crise, a economia em crise, o homem em crise, e eu aqui. Estarei eu aqui em crise? Ou apenas derrubo o muro da paralisia para bem depor um sentimento roubado da minha própria alma encharcada de tédio? O quê vitamina a força do fraco? O quê enfraquece o eterno forte? Palavra e sorte, campo de flores amarelas que exalam um "perfume" podre, de carniça. Que flores são essas? Que cheiro é esse? Onde foram parar os jardins infantes que decoravam quadros e lembranças? Apetrechos ignóbeis, heranças vacilantes. Os sábios não querem mais participar da transformação, hoje quem assume o poder são os pústulas. Meus amigos finalmente assumiram o poder. E se tornaram inimigos, assumiram o tom de farinha azeda do mesmo saco. Vai, caneta, vai. Diga a que veio, preencha essas linhas de caderno barato. Caneta barata. Nem. Caneta brinde. Brindemos ao não. Brindemos ao nada. Brindemos ao mesmo. Brindemos ao sempre. A escória perdida, sem chegada, sem nem ponto de partida. As janelas virtuais pigmentadas por luz vomitando as escrotices de linguagem pútreda. O Brasil (inter)ligado na mesma cagação. E eu aqui. Interrompo meu quase dormir porque a caneta brinde me chamou. Chatuca. Agora tenho que ficar aqui, brincando de nada, em nada, pra nada. Um lapso, um flerte, um interregno dentro do cotidiano de cada ano. E vem ano, e se foram anos. 23horas25minutos. Há um livro na cabeceira. Há um travesseiro e uma coberta. E há o dia seguinte, que já já vai invadir meu mundo. Os passarinhos começarão a sinfonia do amanhecer. (Puta merda, esse clichê me doeu, mas não pude evitar). E a brisa orvalhada da manhã trará um novo respirar. (E o pior é que tem gente que escreve textos e textos só calcados nesses clichezões). Sim, e eu, não seria uma construção genética de clichês? Clichês incrustrados nas células, no DNA? Clichês sincré(ô)t(n)icos da psicosociologia humana? Vai-te, chato. Melhor mesmo pegar o livrinho - outro amontoado de clichês - e calar-te. E amanhã a grita continuará sendo pela mudança do modelo econômico e pelo excesso de desemprego Vai-te, chato. Cala-te e deita-te.